Ayrton Senna divertia-se com voltas “na contramão” em Interlagos
O Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1 é um evento tenso, em geral, para os pilotos brasileiros, pois, além da expectativa da torcida, eles têm uma semana atarefada, com diversos compromissos com patrocinadores e imprensa. Com Ayrton Senna tudo isso ganhava dimensões maiores, ainda mais pelo fato de que ele venceu pela primeira vez em casa apenas no ano em que obteria o tricampeonato, em 1991. Mas Senna dava um jeito de ir ao autódromo de Interlagos, na zona sul de São Paulo, para se divertir, deixando toda a tensão de lado. Quando quase ninguém estava lá, o tricampeão gostava de pegar o sentido inverso do circuito paulistano, que é homologado como anti-horário, para experimentar as curvas de uma maneira completamente nova.
Quem conta essa história é Edgard Mello Filho, jornalista e ex-administrador de Interlagos. “Era quase um lugar-comum, um ritual dele”, disse, referindo-se ao gosto especial de Senna. “As curvas passam um sabor diferente. Imagine aquela Junção ao contrário, em descida em vez de em subida.” Edgard contou que, quando podia, Senna visitava o autódromo para saber como estava o circuito. Nessas ocasiões, o piloto até se arriscava a dirigir um “Opala velho” cujo apelido era Onça: “Muito podre, mas todo enjoado, de pneus novos”, nas palavras do ex-administrador. Mas às vezes Senna guiava as belas máquinas com as quais ia ao local, “e a voltinha dele na contramão era imperdível”.
Edgard recordou-se de uma vez especial: no fim de 1993 ou no começo de 1994, Ayrton emendou uma volta ao contrário na outra e não queria saber de parar. “Ele começou a descascar, descascar, e decidi provocá-lo um pouco. Era um daqueles dias em que era para ser assim. Ele resolveu acelerar e eu, provocar. Então, aticei um pouco, simulava uma narração em que dizia que ele estava sendo perseguido por aquele piloto francês narigudo [Prost] e que o inglês [Mansell] também vinha perto, queria passá-lo por fora, e ele dizia: ‘Não vai passar! Não, por fora não passa”’. E começou a descascar com aquela encrenca lá, uma perua Audi – o carro era um demônio. Foi memorável”, contou o jornalista.
Outro carro usado por Senna nessas brincadeiras era um Fusca “cuja porta nunca fechava”, de acordo com Edgard. Em voltas normais, segundo ele, o tricampeão costumava estacionar para vistoriar determinados trechos da pista e dar sugestões de como melhorá-los. “Enfim, após o término, virava e dava cinco ou seis voltas na contramão”, relatou o ex-administrador.