“Duplas mistas”: existe espaço para o companheirismo na São Silvestre
Embora não haja uma competição direta entre homens e mulheres em corridas de rua, a maioria das provas permite que eles corram juntos. A tradicional São Silvestre, de quase nove décadas de existência, tem essa característica – nela, a distinção entre homens e mulheres só ocorre nos pelotões de elite. A não segregação faz com que seja perfeitamente possível “correr em duplas mistas”, cujos integrantes são amigos, namorados, casados ou parentes. Em um desafio individual como a São Silvestre é, também existe espaço para o companheirismo.
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Esporte a dois
Um casal que participou da prova neste 31 de dezembro de 2013 veio de Volta Redonda (RJ). Essa viagem representou a primeira de Helder Grisoni e Aline Lima Soares Grisoni a São Paulo. Essa participação na prova paulistana teve como origem o gosto de Aline pela corrida. “Ela começou a correr para manter a saúde e passou a gostar disso. Daí comecei a treinar mais seriamente com ela. No meio de 2013, tivemos a ideia de fazer a São Silvestre”, afirmou o marido, que é militar e corre no Exército.
A esposa disse ter se identificado com a corrida pedestre. “Foi minha primeira atividade física. Eu me identifiquei… Não competimos mais porque em nossa cidade há pouca competição. Daí não dá para viajar sempre, pagar hotel”, afirmou antes da prova de 15 km. Depois dela, Aline contou ter recebido o incentivo de Helder, que correu bem ao seu lado: “A última subida foi mais complicada, mas conseguimos; foi na corrida leve, quase caminhando. Ele foi me ajudando, porque havia horas em que eu queria caminhar (risos). Já está nos planos voltar em 2014”.
Marisa e Guilherme Accioly, mãe e filho, largaram juntos, mas concluíram sua primeira São Silvestre em momentos diferentes. “A subida da Brigadeiro foi o trecho mais cansativo. Passei por lá correndo; minha mãe, caminhando. Só nos reencontramos na chegada. Já nos desencontramos logo depois da largada e cada um foi por si”, contou o advogado.
Foi a mãe quem incentivou o filho a correr. “Tem sido muito interessante e muito bom ter a companhia dele nas provas”, declarou Marisa, professora universitária, que em abril de 2013 passou a quase mensalmente frequentar corridas de rua com Guilherme. Até 2012, era apenas ela quem corria – e em eventos de 5 km. Juntos, têm o costume de competir nos de 10 km.
Amigos, como Lincoln Ikeda e Rosangela Lima, moradores de Campinas e Sumaré, também correm juntos. ”Fizemos uma preparação específica para a São Silvestre – de três meses, mais ou menos”, disse ele, que participa de triatlos, mas nunca havia competido na São Silvestre. “Ela que conseguiu me arrastar até aqui, me sugeriu fazer essa corrida. Fiquei à disposição dela para treiná-la, então vim fazer a prova com ela.” Antes da largada, Rosangela acrescentou: “Meu amigo aqui é Ironman, já está acostumado. Será minha primeira corrida de 15 km”. Lincoln, disposto a acompanhá-la, disse não ligar tanto para desempenho: “Nossa maior intenção é curtir a prova, conhecendo melhor a cidade de São Paulo de uma forma saudável”.
Lincoln considerou “excelente” a participação da dupla de amigos: “Conseguimos atingir nossos objetivos: terminamos a prova sem caminhar e com o tempo aproximado de 1h40min”. Ele ainda relatou: “Como a largada é bastante ‘congestionada’, saímos numa boa e administrando o ritmo o tempo todo para ela não sair daquilo que tínhamos combinado. Fizemos a hidratação em todos os pontos e, na subida da Brigadeiro, aumentamos um pouco o ritmo, pois ela [Rosangela] estava se sentindo bem e puxei um pouco mais”.
Houve marido que não acompanhou a esposa durante a prova, mas fez companhia a ela antes e depois da largada. Esse é o caso de Rodolfo Valente, gerente de RH, e Ana Lúcia Tavela, farmacêutica, de São Paulo: “Meu papel é o apoio moral em todas as corridas”, afirmou ele. “Em algumas, levá-la; em outras, tentando correr [até 10 km, por enquanto]. Mas sempre eu ficava para trás, porque ela sempre correu mais do que eu”.
Assim como os outros corredores amadores mencionados nesta reportagem, Ana participou da São Silvestre pela primeira vez. Para se preparar, fez ao longo do ano diversas provas de 10 km e uma de 15 km. Ela se disse muito impressionada com o clima gentil da São Silvestre. “Percebi como o brasileiro é um povo animado, engraçado, que gosta de participar das coisas”, relatou. “As pessoas se ajudam e, quando trombam com você, pedem desculpa.”
Embora tenha considerado o evento bem organizado, fez um comentário: “O primeiro ponto de hidratação era um pouco longe da largada [no km 4,3]”. Observou pessoas caminhando – e em grupos, no meio da rua – logo nos três primeiros quilômetros, o que apontou como dificuldade para quem vem de trás.
Ana foi incentivada por desconhecidos ao longo da prova: “Na Brigadeiro [Luís Antônio] precisei caminhar, mas, quando você começa a caminhar, ainda mais lá, o pessoal motiva você, quem está correndo bate nas suas costas e diz: ‘Vamos lá’. Foi bem gostoso”. Mas espera ter a companhia do marido em 2014: “Vou incentivá-lo durante o ano para ele ir comigo. O percurso da prova é bacana, porque você passa por vários pontos turísticos, e é legal você ter alguém com quem dividir isso”.
Quenianos dominam
Edwin Rotich conquistou o bicampeonato da São Silvestre. Os três primeiros lugares do pódio foram ocupados também por quenianos, Mark Korir e Stanley Koech. O melhor brasileiro foi Giovani dos Santos, o quarto colocado. No feminino, houve vitória queniana também, de Nancy Kipron. A brasileira mais bem classificada – e melhor não africana – foi Sueli Pereira da Silva, a sexta colocada. Estavam inscritos 27,5 mil participantes, e alguns deles passaram pelos primeiros sensores de cronometragem após mais de meia hora da autorização da largada.