‘5 km são minha maratona’: diva do megafone conta bastidores do maior clube feminino de corrida
Quem já participou de alguma corrida de rua, especialmente as femininas, deve ter encontrado um grupo enorme de mulheres trajando roupas iguais, carregando bandeiras e entoando a plenos pulmões que “uma diva nunca está sozinha”. E, após a largada, é provável que corredores mais atentos já tenham visto no percurso uma delas portando um megafone – às vezes solitária; em outros momentos muito bem acompanhada. Bruna Coelho, dona de tal instrumento, o utiliza para propagar frases de incentivo aos demais atletas, mostrando que a torcida pode carregar os corredores até a linha de chegada.
Além de estar à frente desde 2019, como administradora, do Divas que Correm, grupo que neste ano completa 11 anos e conta com mais de 300 mil pessoas inscritas, ela é também contadora, mãe e avó. Sabem aquela máxima de que “em coração de mãe sempre cabe mais um”? Então, recentemente, a diva do megafone, por incentivo do marido, Jessé Arruda, passou também a ser estudante, no curso superior de educação física. Foi, porém, justamente esse órgão tão sensível e carregado de sentimentos que derrubou Bruna. “Logo depois de assumir o Divas, eu infartei”, conta.
Sem querer desistir do seu grande projeto de vida, incentivada novamente pelo companheiro, Bruna, naquela época, passou a participar das provas como espectadora. E, é claro, com o seu megafone a tiracolo. Em razão do problema de saúde, a função cardíaca ficou bastante debilitada (em torno de 31%). “Eu tinha de controlar as emoções; muitos me viam nas provas e não entendiam por que eu não estava, necessariamente, correndo ou participando dela. Por incrível que pareça, até já me xingaram”, conta.
Isso porque Bruna faz questão de se inscrever nas provas em que vai acompanhar seu grupo – inclusive com o número de peito –, mesmo não correndo, mas podendo circular pelo evento. “Já me chamaram de mentirosa, alegando que eu estava, de alguma forma, trapaceando para vencer”, revela.
Mesmo com o coração debilitado, ela nunca desistiu de voltar para a pista de corrida. “Pra mim, é muito difícil não correr. Foi um processo de quase dois anos para aceitar que eu não posso mais correr; pelo menos, não do jeito que eu corria antes do infarto”, admite Bruna.
Foi então na Maratona do Rio de 2024, após a liberação médica, que Bruna participou (correndo) de uma das provas. “A minha maratona é a prova de 5 km; só eu sei o quanto aquela prova representou para mim”. Infelizmente, a administradora do Divas que Correm não está sozinha nessa.
De acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde, conduzida pelo IBGE em 2019, as mulheres brasileiras são menos ativas que os homens: enquanto 32,1% dos homens foram considerados insuficientemente ativos, quase metade das mulheres (47,5%) receberam essa classificação. A resposta para o desequilíbrio na balança pode ser explicado com dados do estudo global da ASICS “Move Her Mind”, que apontou que para 74% das entrevistadas falta tempo para treinar, já que, geralmente, os cuidados maternos e do lar ficam sob responsabilidade das mulheres.
Independentemente da distância, uma de 5 km pode ser tão desafiadora quanto a de 42,195 km. E o que as duas provas têm em comum é que a torcida pode ser o fator determinante nessa jornada. Para quem está familiarizado com provas internacionais, as pessoas estão presentes em, praticamente, todo o percurso. Culturalmente, apesar de os brasileiros amarem correr, eles não amam na mesma proporção torcer pelos corredores.
É claro que, em tudo na vida, existem exceções. Mas, no geral, um corredor no Brasil realiza o percurso da prova contando consigo mesmo e, vez ou outra, com o apoio dos próprios colegas de prova. Logo, quando um grupo de corrida feminino, como o Divas que Correm, na figura de Bruna e suas líderes regionais, ou mesmo um de seus membros, se dispõe a madrugar para torcer pelos corredores durante uma prova, é, no mínimo, necessário olhar com mais carinho e atenção para elas.
Quando a administradora do grupo acompanha alguma prova, Bruna precisa tomar cerca de 15 remédios diários bem antes de sair de casa. Ela, que mora em Sorocaba, acompanha a montagem da tenda e também reúne “suas divas” antes da largada de diversas provas em São Paulo – a mais recente, a Corrida Superman & Supergirl, realizada no dia 30 de junho de 2024, domingo, na região do Ibirapuera.
Certa vez, para tentar amenizar o cansaço de Bruna ao se locomover durante as provas, o grupo realizou uma “vaquinha” e comprou patinete elétrico para ela. “A ideia era acompanhar minhas divas em percursos mais longos, só que, na primeira prova em que eu testei, fui novamente xingada”, diz ela ao revelar que o equipamento não foi mais usado depois do incidente.
“Eu já pensei em desistir várias vezes”, diz ao relatar a dificuldade que vem enfrentando nos últimos anos. Porém, quando recebe as mensagens das integrantes de seu grupo contando que conquistaram um RP (recorde pessoal), pegaram pódio ou simplesmente completaram o percurso, isso faz Bruna repensar no futuro e no papel dela à frente do Divas que Correm.
“Se eu não puder competir, eu vou ensinar”, diz. Bruna está no segundo semestre do curso de educação física e conta, com entusiasmo, que só recebeu “notão” nas disciplinas. “Eu vou usar o que estou aprendendo na faculdade para ajudar ainda mais as minhas divas”, garante.
Para fazer parte do Divas que Correm, segundo Bruna, a atleta só precisa estar disposta a ser melhor do que ontem. O grupo não cobra mensalidade, podendo qualquer pessoa que acredita nos mesmos ideais participar de encontros, treinos e corridas. É possível ainda ingressar nos grupos de WhatsApp e ficar por dentro das provas de que a equipe vai participar. Durante os eventos de corrida, é possível adquirir os produtos da marca – adultos e infantis.
As próximas provas de que as Divas que Correm participarão são SP City Marathon (28/7), Harry Potter Fun Run (5/10), Mulher-Maravilha (24/11), por exemplo.
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